O racionalismo crítico em Karl Raimund Popper

Aos 92 anos de idade, faleceu na Inglaterra o célebre filósofo Karl Popper(1902-1994). Austríaco de nascimento fugiu do nazismo quando contava com seus 30 anos. A filosofia de Popper, (o racionalismo crítico), ocupa-se das questões relativas à teoria do conhecimento, ou seja, epistemologia. Para nós compreendermos o pensamento do filósofo faz-se viável termos uma noção de sua teoria dos três “mundos”, do seu modelo quádruplo, do pensamento indutivo e do conhecimento objetivo. Assim sendo, pesquisaremos tais pensamentos. Em relação à teoria dos “mundos”, temos o mundo 1; de objetos físicos ou de estados materiais; o segundo mundo, de estados de consciência ou de estados mentais, de disposições comportamentais para agir (senso comum), e o mundo três, que é o mundo de conteúdos objetivos, de pensamentos críticos. O terceiro mundo assemalha-se com a teoria das idéias de Platão, mas sabemos que o mundo das idéias de Platão é imutável e verdadeiro. E o do filósofo Karl Popper é feito pelo homem e é mutável, contendo teorias verdadeiras e falsas, e com isso, ele está aberto às críticas e a conjecturas e refutações. Lembrando que segundo Popper o mundo três é autônomo. Porque é objetivo e é a partir dele que a ciência progride. Por que ele é autônomo? Pelo fato que: encontramos no mundo três teorias que são científicas, conhecimentos objetivos. E quando “colocamos” essas teorias em um livro, (mundo um) e se alguém vir a ler o mesmo poderá encontrar novos problemas ou teorias inesperadas, e mesmo se esses livros fossem destruídos temos o conhecimento em nossa mente, o qual não será destruído com os mesmos. Vale ressaltar que a filosofia tradicional tem estudado o conhecimento no sentido subjetivo; com expressões “eu sei”, “estou pensando”, Popper refuta tal pensamento dizendo: “o que vale para o progresso do conhecimento científico é o pensamento objetivo”. Encontramos o pensamento da filosofia tradicional, o senso comum, a indução no mundo dois. O que é relevante para a epistemologia é o estudo de problemas científicos e situações de problemas, de argumentos críticos, ou seja, o mundo objetivo, o três. Resumindo: o terceiro mundo é um produto natural do homem. O mundo três é autônomo, pelo fato de ser produto nosso e de ter um forte efeito de retrocarga sobre nós. “Há muitas teorias em si mesmas, e argumentos em si mesmos, e situações de problemas em si mesmas que nunca foram produzidos ou entendidos e podem nunca ser produzidos ou entendidos pelos homens” (POPPER, 2006, p,118). Tal como um livro. Mas é através da interação entre os “mundos” que o conhecimento objetivo cresce. Como o mundo três é autônomo, tem teorias objetivas e está sujeito à crítica, novas teorias não pretendidas, novos problemas inesperados surgirão (como vimos anteriormente) podendo ser escrito da seguinte forma: P1_TT_EE_P2; Partindo de um problema P1, passamos a uma teoria experimental, ou uma solução experimental TT, e pode ser errônea; para tanto, será submetida à eliminação de erros EE, que pode consistir de discussão crítica ou de testes experimentais, de qualquer forma, novos problemas P2 brotarão de nossa própria atividade criadora, ( mundo três). Tal teoria pode ser aplicada ao Darwinismo, mas nos organismos as mutações são as tentativas, e a eliminação de teorias é a (eliminação do ser vivo); o animal procura resolver seus problemas (ambientais) se adaptando com as modificações dos seus órgãos, mas nunca estarão salvos dos próximos, e inesperados problemas. Nós diferimos dos animais através linguagem, sendo principalmente a função descritiva e a argumentativa. A função descritiva “emerge a idéia reguladora de verdade” (POPPER, 2006, p, 121). A função argumentativa pressupõe a função descritiva: os argumentos são acerca de descrições “criticam descrições do ponto de vista das idéias reguladoras de verdade” ( POPPER, 2006, p, 121). Com estas funções torna-se o mundo da ciência. Ao desenvolvimento das funções superiores da linguagem é que devemos nossa humanidade, nossa razão. Pois nossos poderes de raciocinar nada mais são que poderes de argumentação crítica (Popper, p. 122). O seguinte esquema é válido para o mundo animal assim como para o homem: P1-TT_EE- P2; “torna-se o esquema do crescimento através da eliminação de erros por meio da crítica racional sistemática. Torna-se o esquema da procura da verdade e do conteúdo por meio da discussão racional. Dá uma descrição racional da emersão evolucionaria e de nossa autotranscendencia por meio da seleção e da crítica” (Popper, 2006, p, 122). Em relação a ciência Popper tem o seguinte problema: quando pode uma teoria ser classificada como científica? Ou, existe um critério para classificar uma teoria científica? Popper formulou muitas vezes no seu problema como a procura de uma distinção entre métodos empíricos e o não empírico, ou mesmo pseudo-empírico, isto é, o método que embora se utilize da observação e da experimentação não atinge o valor científico. Popper em 1919 fica desapontado com as teorias Marxistas da história, da psicanálise e a psicologia individual de Freud. Indagava perguntando o que tem de errado com elas! Ele sentia que as três teorias embora mesmo se apresentando como ramo da ciência, tinham de fato mais em comum com os mitos primitivos do que com a própria ciência, onde se aproximava mais da astrologia do que da astronomia Essas teorias pareciam poder explicar praticamente tudo em seus respectivos ramos. O estudo de qualquer uma delas parecia ter o efeito de uma conversão ou revelação intelectual, abrindo os olhos para uma nova verdade, escondida dos ainda não iniciados. Uma vez aberto os olhos, podia-se ver exemplos confirmadores em toda parte: o mundo estava repleto de verificações da teoria (POPPER, 1963, p. 64). Popper chega a conclusão que: toda teoria científica “ boa” é uma proibição: ela proíbe certas coisas de acontecer. Quanto mais uma teoria proibir, melhor ela é. E a teoria que não for refutada por qualquer acontecimento concebível não é científica. A refutabilidade não é uma virtude, mas sim um vício. Todo o teste de uma teoria é uma tentativa de refutá-la. Portanto o critério que define o status científico de uma teoria é a sua capacidade de ser refutada ou testada. O problema que ele procurava resolver “tratava de traçar uma linha entre as afirmações das ciências empíricas e todas as outras afirmações de caráter religioso, metafísico e pseudocientífico. Anos mais tarde em 1928 ou 1929 Popper assegura que: o critério de refutabilidade, é a solução para a demarcação”. E para concluirmos, ressaltamos que Popper nega a indução, mas não por completa, pois diz que tal teoria pode ser o ponto de partida, mas não para tê-la como conhecimento último ou “verdadeiro”. Sabemos que a indução parte da observação e experiência; “o sol nascerá amanha por que assim ele tem o feito no passado”, para a indução tal pensamento está correto. Popper nega tal método, apelando para a teoria do conhecimento no sentido objetivo, aqueles formulados lingüisticamente e criticados racionalmente; e eis o ponto crucial: a ciência começa com um problema, e não com uma observação, por isso que ele não aceita a indução como “verdadeira” ou última teoria, e sim como ponto de partida, o qual, depois de criticada, será submetida e eliminação de erro. Não parte da observação pelo seguinte fato: Popper propõe um exemplo afirmando que a observação não pode preceder os problemas. E que a ciência não começa pela observação, como alegam os indutivistas. A crença que nós podemos começar exclusivamente com observação uma teoria é um absurdo, ou seja, anotar as observações “naturais” e levar a uma ciência. Popper refuta apresentando os seguintes argumentos: “tomem lápis e papel; observem cuidadosamente e anotem o que puderem observar: “observem, isto é um absurdo!”. De fato, não é mesmo habitual usar dessa forma o verbo observar. A observação é sempre seletiva: exige um objeto, uma tarefa definida, um ponto de vista, um interesse especial, um problema” (POPPER, 1963, p 76). Sendo assim, para observar, devemos ter em mente uma indagação definida e um problema, para que possamos ser capazes de decidir por meio da observação. Portanto a ciência marcha de velhos problemas para novos problemas. Contudo apenas temos teorias provisórias, optamos por aquela teoria que melhor satisfaça nossos problemas. Assim, a sociedade transforma-se, e a ciência progride como também nossos conhecimentos, e em especial objetivo, (mundo três). O CRITÉRIO DE DEMARCAÇÃO “Como é que se pode distinguir as teorias das ciências das especulações pseudocientíficas ou metafísicas?” (Popper, 1987ª, p. 177). A solução através do método de acordo com Popper, é:” a ciência se caracterizava pela observação e pelo método indutivo, enquanto a pseudo ciência e a meta física se caracterizavam pelo método especulativo” as teorias científicas eram obtidas a partir de fatos e por eles eram verificadas. Os positivistas (o positivismo é uma epistemologia empericista, indutivista), eram antimetafisicos. Popper não aceita tais teorias! O critério de demarcação por Popper é a testabilidade, refutabilidade ou falseabilidade para as teorias científicas. Elas, as teorias científicas, quando combinadas com condições específicas, devem proibir algum acontecimento que é possível de ser observado. As teorias pseudocientíficas ou metafísicas são irrefutáveis pois não proíbem nada, não possuem falsificadores potenciais. Tais como o determinismo e o indeterminismo. A refutabilidade, como demarcação, pertence ao universo das teorias científicas, podendo elas ser falsificáveis, possuindo falsificadores potenciais. Mas a falsificação é sempre uma conjectura. A falsificabilidade é coerente com a atitude crítica, a verdade da ciência “pode-se” provar através da exclusão de teorias falsificadas, substituindo por novas que podem chegar mais perto da verdade. Existem teorias pseudocientíficas que são capazes de dar conta de qualquer fato, mas essas são irrefutáveis, sendo a psicanálise de Freud, Marx e Adler. Segundo o filósofo, as teorias científicas são construções humanas, criações da nossa mente, tentativa de compreender o mundo. Imaginação algo não racional- mas tal como esses fatos a metafísica, o senso comum são importantes, pois podem ajudar no início das teorias, para dar início a refutação. “Não há fontes últimas do conhecimento. Todas as fontes são bem vindas; e todas as fontes e sugestões estão abertas ao exame crítico” (POPPER, 1982, p. 55). POPPER, Karl Raimund. Conjecturas e refutações: o desenvolvimento do conhecimento científico. Coimbra: Almedina, 2006. POPPER, Karl Raimund. Conhecimento objetivo: uma abordagem evolucionária. Belo Horizonte: Itatiaia, 1999.